Eu sou a Pê. Nasci mais ou menos em 2012 (é que fui adotada e perdi meu RG nas ruas). Eu morava na rua, de boas, mas um certo dia me enfiaram um cano de PVC no pescoço e me furaram um olho. Fiquei agradecida de terem me poupado a outra vista, mas ainda assim não entendi porque aquele tio humano fez aquilo - nem lembro se foi um só ou se foram alguns... Eles devem ter se incomodado de eu ter pedido
comida a eles, ou algo assim. Bom, uns tios queridos contaram às tias lindas da ONG SOS Vira-Lata sobre uma cadela que andava com um cano de PVC pelas ruas, com um olho furado. Elas me procuraram, mas eu não ficava no mesmo lugar, pois estava aflita, estava em busca de alguém que me tirasse aquilo, que olhasse pra mim e tentasse curar aquele ferimento todo...doía demais, demais. Aos poucos, foram se formando bichinhos nos meus ferimentos (nos provocados pelo cano e no do meu olhinho). Eu não conseguia me coçar, não conseguia me desvencilhar daquela agonia. Eu não conseguia entender. Passaram-se mais ou menos 3 semanas, até que uma tia da ONG enfim me encontrou. Eu estava à beira da morte, num armário de cozinha velho, num terreno baldio. Hoje essa tia é a minha dinda. Ela me pôs no carro, naquele estado, infestada, apodrecida, e me levou correndo até uma clínica da cidade. Até hoje eu agradeço a minha dinda, que não ligou de eu estar toda remelenta, encardida, podrinha, e mesmo assim me pôs no carro dela. Foi mals, dinda! Fiquei internada umas 3 semanas na clínica. Precisei de duas transfusões de sangue, pois eu praticamente não me alimentei desde que aquele tio malvado me maltratou. Eu estava mesmo praticamente mortinha. Quando as tias da ONG me postaram na fanage deles, pedindo ajuda financeira já que meu tratamento ia ser pesado, a maninha e o amigo já chamaram eles inbox, falando do interesse em me adotar. É que a maninha já ia na feirinha de adoção da ONG adotar um cãozinho, naquele domingo, mas quando me viu, pensou "é esta mesmo que vai receber todo o amor que eu tenho aqui pra dar". Eles iam me visitar todos os dias na clínica, que era pra eu já ir me acostumando com eles. Mas eu estava inanimada, sem interesse mais na vida. Maninha fazia carinho no meu corpinho frágil de 6 quilos na época (hoje eu tenho 12,5kg), e era a mesma coisa que ela fazer carinho num pedaço de papel, pois eu não demonstrava nada, nenhum sinal, nada. Mesmo assim, eles continuaram indo em busca da minha confiança, do meu interesse novamente pela vida. Eles imaginavam que eu era feliz, ainda que morasse nas ruas, e que eu era serelepe, ativa, e queriam resgatar isto em mim. No dia em que eu fui pra casa da maninha e do amigo, eu estava ainda sem pelos, cheia de feridinhas na pele ocasionadas pelas pulgas, e muito, muito magra. Ainda assim, abanei o rabinho e fui em direção deles. Maninha me conta que jamais esquece desta cena. Maninha também diz pra todo mundo que eu surpreendi a ela e ao amigo: já fui ficando felizinha e iniciando minhas primeiras estripolias em casa. Ainda assim, eu não descansava perto deles. Escolhia sempre um cantinho longe pra ficar. Mas maninha e amigo respeitaram esta minha decisão, por entenderem que isto era apenas consequência da tortura pela qual eu passei. Até hoje eu ainda sou meio 'na minha'. Porém, demonstro meu amor e minha gratidão por eles de outra forma: abanando muito a rabiola quando eles chegam em casa, faço festinha quando os vejo pela manhã, cuido da maninha quando ela se afasta de mim na pracinha, ficando perto dos dois se eles se distanciam...
Eles entenderam que eu, assim como cada animalzinho, tenho minhas particularidades. E que eu poderia ficar linda, saudável e feliz como de fato eu fiquei. Eu não tenho latidos para agradecer a eles por terem me acolhido mesmo tão feinha, subnutrida, cheia de feridas e com a saúde frágil; agradeço por eles não terem optado por um cãozinho lindo e fofinho, como normalmente se faz. Somos uma família feliz e tudo o que eu preciso eu tenho: amor. Claro, um petisco de vez em quando também não vai nada mal. =D
Uma piscadinha a todos vocês!