23/01/2021
O excesso de direito como causa de injustiça
Nas ultimas décadas os direitos e proibições relacionadas a animais são pauta constante.
Novas leis surgiram e cada vez mais encontramos leis inconstitucionais; municípios e estados legislando sobre matéria federal; proibições das mais diversas.
Vereadores e deputados aprenderam que apresentar projeto de lei é mostrar trabalho. Dessa forma ganham apoio popular e continuam a se reeleger. E a causa animal é alvo constante dessas investidas.
Na maioria das vezes não conhecem a legislação vigente e criam diversas proibições que já tem previsão legal. Ou mesmo criam punições genéricas.
"Ainda não conseguimos acautelar-nos contra o fetiche da lei. Acreditamos que a lei resolva tudo. Bastaria, contudo, uma consistente reflexão para saber que não é assim.
Os romanos já afirmavam, com inegável razão: "Summum ius, summa injuria" — ou seja, o excesso de direito conduz à mais profunda injustiça. E um escritor francês, Jean Cruet, chegou a escrever um livro, A Vida do Direito e a Inutilidade das Leis, com epígrafe eloquente: "Sempre se viu a sociedade modificar a lei; nunca se viu a lei modificar a sociedade"." (A era das leis https://www.conjur.com.br/2014-set-03/renato-nalini-excesso-normas-nao-faz-brasil-pais-justo)
Pouco se fala sobre os problemas causados pelos excessos de proibições e sobre leis injustas. Ficam vigentes e "arquivadas" até que alguém resolva sacudir a poeira e aplicar aquela norma esquecida. Exemplo disso é a infeliz lei que proíbe cães da raça Pit Bull no estado de Santa Catarina.
E logo surgem tentativas de proibições como foi visto em Penha, SC, onde os vereadores tentaram proibir os cães de latir.
Quando se proíbe algo que pode ser regulamentado, abre-se brecha para a atividade clandestina. Quando se regulamenta algo e se exige algo demasiadamente difícil, sempre haverá a atividade paralela.
Duas das regras mais antigas da humanidade são a proibição de matar e de roubar. As punições são altas, em alguns países se pune com a morte, porém quem quer realmente matar e roubar, vai fazê-lo. Mas estamos falando de algo indefensável. A morte só é autorizada em algumas situações. O roubo em tese não é permitido em nenhuma hipótese porém altas cargas tributárias, indústria da multa etc contrariam isso. Mas a proibição em si não garante o fim de uma prática.
Atividades que podem ser exercidas com animais e que não configurem maus tratos deveriam ser permitidas e regulamentadas de forma simples. Maus tratos já é crime. A conduta é punível com prisão.
Quando criamos uma conduta de vida em que buscamos a proibição de tudo aquilo que não concordamos, não respeitamos a liberdade alheia e nem a nossa própria liberdade.
No Brasil há previsão legal típica para todas as práticas desprezíveis. Não é necessário criar novas proibições. É necessário aplicar o que já existe.
Com relação a condutas com animais, não faltam proibições e regras de bem estar.
Não podemos impor a todos aquilo que acreditamos, principalmente quando a crença alheia e contrária também tem um motivo justo.
A falta de empatia com o ser humano está, cada vez mais, disfarçada de amor aos animais. Na verdade só amam quem não os contraria e tem desprezo pela própria espécie.
Ana Paula Ruzinski
Bacharel em Direito
Advogada não atuante
Criadora de cães de raça
[Artigo originalmente publicado no jornal O Estado de S. Paulo desta quarta-feira (3/9)] Ainda não conseguimos acautelar-nos contra o fetiche da lei. Acreditamos que a lei resolva tudo. Bastaria, contudo, uma consistente reflexão para saber que não é assim. Os romanos já afirmavam, com...