19/08/2015
AVALIAÇÃO DAS MARGENS CIRÚRGICAS: O CONCEITO, A TÉCNICA E OS PROBLEMAS.
• O CONCEITO
As expressões “margem de segurança” e “margem cirúrgica” são usadas freqüentemente como sinônimas, embora tenham significados distintos.
A MARGEM DE SEGURANÇA é pré-estabelecida pelo cirurgião e faz parte do planejamento cirúrgico.
A MARGEM CIRÚRGICA é avaliada posteriormente pelo patologista ao exame da peça cirúrgica.
• A TÉCNICA
MARGEM DE SEGURANÇA.
Teoricamente é uma quantidade variável de tecido, supostamente normal, que envolve os tumores, tanto em lateralidade quanto em profundidade. No entanto, como não se enxerga histologicamente toda a margem de segurança, pode ocorrer que restos tumorais infiltrem esta faixa de tecido sem que se perceba tal acometimento. A extensão desta faixa de tecido “supostamente normal” varia de cirurgião para cirurgião e de acordo com a situação clínico-cirúrgica. De uma forma grosseira poderia se dizer que quanto maior a margem de segurança, maior a possibilidade de se retirar completamente o tumor, embora isso possa significar maior trauma cirúrgico. Ao contrário, margens de segurança mais reduzidas acarretariam maior chance de recidiva do tumor, com menor trauma cirúrgico
Na literatura científica existe uma grande quantidade de trabalhos sobre recomendações para se aumentar a possibilidade de êxito em relação a uma dada margem de segurança. O problema é que muitas variáveis podem interferir no sentido de se aumentar ou não a margem de segurança pré-definida. Fatores como o tipo histológico do tumor, o seu tamanho, sua delimitação clínica, sua localização e o fato dele ser primário (quando o tumor é tratado pela primeira vez) ou recidivado (quando o tumor é tratado mais de uma vez), influenciam significativamente o tamanho da margem de segurança. Desta forma, um consenso entre as medidas recomendadas é muito difícil de ser obtido.
Por exemplo, um fator que limita muito a margem de segurança recomendada é a localização do tumor. Tumores localizados muito próximos de estruturas de importância tanto funcional quanto estética podem comprometer a aplicabilidade da regra. Um tumor localizado na pálpebra inferior ou a 1 mm do vestíbulo nasal. Uma vez que aparentemente o tumor não acomete toda a pálpebra ou a asa nasal, dificilmente um cirurgião iria retirar estas estruturas apenas porque elas estariam dentro da margem de segurança a ser adotada. Porém, se o tumor estiver comprometendo histologicamente estas regiões, poupando-as da retirada, não se vai resolver o problema oncológico. Ao contrário, se o cirurgião resolve ser agressivo e retira tais estruturas anatômicas seguindo cegamente a margem de segurança, ele poderia estar causando uma mutilação funcional ou estética desnecessária, caso se demonstre que o tumor não acometia histologicamente estas regiões.
Este é o dilema que todo cirurgião tem que resolver quando vai operar um tumor baseado no conceito de margem de segurança.
MARGEM CIRÚRGICA
A margem cirúrgica é verificada no laboratório de anatomia patológica após a cirurgia.
Para a avaliação mais detalhada e fidedigna das margens cirúrgicas, recomenda-se que seus limites sejam identificados individualmente através de um padrão de fios de sutura, como exemplificado na figura 1, e que este padrão seja informado ao patologista.
Quando a amostra é recebida pelo patologista, a amostra é “pintada” com tinta nankim. Diferentes cores podem ser usadas para estabelecer pontos de referência e, por conseguinte, a orientação possa ser conseguida sob o microscópio. A área tingida é deixada secar antes da amostra ser clivada de modo adequado (figura 02).
A tinta externa ao tecido sobrevive ao processamento e é visível ao microscópio durante a avaliação microscópica do tecido (figura 03).
Com isso é possível verificar se restou tumor na margem. Se há tumor na margem, significa que ficou tumor no paciente e é necessário re-operar ou concentrar a radioterapia naquele local. Fala-se que a margem cirúrgica está comprometida. Se não há, fala-se em margens cirúrgicas livres. Esta informação é da maior importância para prevenir recidivas.
• OS PROBLEMAS:
FALSO POSITIVO
A visão que o patologista tem da margem cirúrgica microscópica depende essencialmente da forma como a peça cirúrgica foi preparada. O primeiro passo é saber se ele está vendo ao microscópio, realmente, a borda da peça cirúrgica. Do momento operatório em que é retirada até o início de seu processamento no laboratório, ela é normalmente colocada em um frasco contendo formol e depois transportada ao laboratório. Dependendo da situação, isso pode levar até mais de um dia. O simples transporte mal feito, a falta de cuidado com o espécime ao colocá-lo no frasco com formol – principalmente se ele tiver a boca com diâmetro menor do que o da peça cirúrgica – podem provocar artefatos de técnica, como desprendimento de tecidos da periferia da mesma, capazes de falsear o resultado. Se a peça cirúrgica não chega intacta ao laboratório, a análise de sua borda pode ser comprometida, ou seja, o simples cuidado com o espécime cirúrgico é importante para que o resultado seja fidedigno. Isso parece óbvio, mas é bom ressaltar que não é o médico quem manuseia a peça logo após o ato cirúrgico e a transporta para o laboratório.
FALSO NEGATIVO
Outras variáveis de importância são o número e a incidência dos cortes realizados. Um corte histológico de rotina tem quatro micrômetros de espessura (quatro milésimos de milímetro). Com isso, o exame histopatológico examina menos que 0,01% da superfície total da peça cirúrgica. Isto é, o que se faz rotineiramente é uma amostragem.
A figura 04 mostra algumas formas padronizadas utilizadas rotineiramente em laboratórios de anatomia patológica. Facilmente verifica-se que os cortes não cobrem a totalidade da extensão das bordas cirúrgicas, ou seja, o patologista examina lâminas previamente preparadas para o exame microscópico, dentro de uma rotina laboratorial já definida e em muitas vezes, com poucos cortes.
Ou seja, qualquer avaliação que o patologista faça, baseados em cortes de rotina, apenas diz respeito ao montante da área efetivamente examinada, o que é muito pouco.
Dependendo do caso, pode acontecer que o laudo do exame histopatológico da peça cirúrgica registre que as margens cirúrgicas estavam livres, mas na realidade não estavam, pois o laudo se refere apenas à parte efetivamente examinada.
Assim, existem grandes possibilidades de falha, pois a única garantia que o patologista pode dar é a de que, naquele ponto no qual foi realizado o corte, tinha ou não tumor tocando a borda da peça. Mais informações sobre o resto da margem cirúrgica não podem ser dadas porque poucos cortes de toda a extensão da mesma foram examinados.
Baseadas nessa INFORMAÇÃO CORRETA DO PATOLOGISTA, MAS LIMITADA por sua reduzida abrangência, decisões cirúrgicas no sentido de se re-operar ou não podem ser precipitadas.
Enfim, SEMPRE QUE TIVER DÚVIDAS SOBRE UMA MARGEM, NÃO HESITE EM DISCUTIR O ASSUNTO COM SEU PATOLOGISTA !.